Wednesday, March 14, 2012

A MÁQUINA E A VIRTUDE


Ninguém me telefona. Nem sequer os jornalistas. Estou aqui na aldeia sem amigos e sem amigas. Não falo com ninguém. Venho estudar Aristóteles e Lou Reed. Escrevo uns poemas e outros textos. Penso que estou a escrever melhor. Levantei-me às quatro da tarde. Estive no Pinguim e depois no "Pontual" com o Nuno e com o Carlos Andrade. Trabalho durante a tarde. Depois vem o telejornal e provavelmente, como bebi uma cerveja, depois do jantar não vou conseguir concentrar-me na "Poética" de Aristóteles. Mas eu precisava de beber uma cerveja para estar em sintonia com o rock n' roll.
É isso que eles nos vendem; telenovelas, telejornais, novamente telenovelas, concursos, programas imbecis, futebol. É a máquina de embrutecer alegremente, como dizia o meu pai. Roubam-nos a vida, a grandeza, a elevação. Alguns de nós são capazes de romper o feitiço. A maior parte não. Arrasta-se pela vida. Deixa-se levar pelas sombras da caverna, às vezes nem sequer as sombras discute.
Esta miúda da confeitaria, a Diana, tem uma energia fora do comum. Apesar de se enquadrar na máquina tem qualquer coisa de puro, de autêntico. Mas estava eu a falar do tempo que nos roubam. Os arautos da sociedade dos mercados, através dos media, não querem que desenvolvamos a nossa inteligência e a nossa personalidade, querem-nos dóceis, passivos, espectadores de um espectáculo, ainda por cima imbecil, que não controlamos. Querem-nos reduzir a primatas, a meros receptores ou então viram-nos uns contra os outros na luta pela existência enquanto o grande capital factura e avança. São os privilégios dos funcionários públicos, a malandrice dos beneficiários do rendimento mínimo e até dos desempregados, enfim, o desgraçado contra o desgraçado e uma luta, uma guerra que é perfeitamente animal feita de invejas, intrigas e mercearias. Não é este ceramente o sentido da virtude e da nobreza que vem de Sócrates, Platão e Aristóteles.

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