Sunday, January 15, 2012

APOCALIPSE OU NÃO


APOCALIPSE OU NÃO



Apocalipse. Seres humanos lutando por nacos de carne na rua, pilhagens, cidades em fogo, colapso total da civilização


Roma, o império cai. Os lobos saqueiam sem lei, destroem-se uns aos outros. O homem está só no desterro do café. A tempestade á porta. A calmaria aparente. Os outros sub-vivem. Vão-se contentando com migalhas, cada vez mais. Têm um raciocínio simples, "prático". É claro que com alguns, algumas ainda é possível manter conversas elevadas. "Os mortais a custo reconhecem o homem puro", escreveu Holderlin.


Aquele, o adolescente, a quem os deuses bons enviaram para "animar a vida dos homens e não a deixar emurchecer", ainda Holderlin. Eis o homem puro. Mesmo que cante o caos e o apocalipse está cá em nome da vida. É em nome da vida que sobe ao palco, que estuda o homem, que o representa. Em nome da vida, não em nome do útil ou da eficácia.


Até pode ser que estas palavras se percam para sempre, que o caderno se perca. Por outro lado, podem valer ouro. Não têm que fazer parte de um romance ou de um "best-seller". No entanto, o homem tem consciência de que escreve algo de original ou, pelo menos, pouco dito. O homem sabe que vai ser lido por uma pequena minoria mesmo que acredite que as suas palavras um dia chegarão a muitos mais. O homem portava-se demasiado bem na infância e na adolescência. Agora é um rebelde. Interroga-se acerca do alcance dos seus escritos. Há quem diga que já tem um grupo de seguidores. Poderia fundar uma seita.


Apocalipse. Arrependei-vos. Vem aí o juízo final. Os bancos ardem como as nações. Os bebés choram. Porque os trazeis ao mundo? Porventura quereis aperfeiçoar a espécie ou limitai-vos a reproduzir o pensamento comum? Seria diferente se quisesses aumentar o homem. Seria diferente, mulher, se lhe desses esse amor tendo em vista a construção do super-homem. Assim estarias a mudar o mundo, a combater a terra dos relógios e da troca. De contrário, encaminhas a criança para o mercado, para a competição, para a morte em vida. Mulher, tu geras a vida, tu tens nas tuas mãos a humanidade futura. Não a estragues. Não te deixes levar pelo pensamento comum, pela máquina. Aumenta o homem. Aumenta a vida. Oh, como tudo poderia ser se escutasses a liberdade e a vida...

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IDADES D' OURO


Pensar o diferente, fora do pensamento em comum. Ser o homem demoníaco, que dança sobre o abismo, o criador. Sim, ir além dos limites de si mesmo. Sentir nascer em si a estrela: Jesus, Zaratustra, o reino todo. Ir até ao além-Deus e voltar. Atravessar os desertos, percorrer mulheres de sonho, possuí-las. Ser um conquistador, um navegante por mares desconhecidos. Atravessar para o o...utro lado. Ficar lá. Iluminado. Embriagado. Extasiado. Sim, as palavras conduzem-me lá. Ao lugar sagrado. Há idades d' ouro em mim. Que importância têm o negócio e o interesse se consigo atingir as alturas? Sim, voar como um deus na confeitaria. Idades d' ouro em mim. Brilho. Não sei se terei seguidores mas brilho. Todo eu sou luz. Todo eu sou fogo. Diante do "Talho da Emília do Lúcio" transfiguro-me. Todo eu sou metamorfose, homem a construir-se, explosão. As letras dançam, ziguezagueiam, serpenteiam. Sou trapezista, estou no circo. Ouço palmas, luzes, cores. Embriago-me de sons, ruídos. Todo eu sou dança. Rodopio. Berro de felicidade. Estou lá. Estive lá. Beijei a mais bela das mulheres, a mais inacessível. Não me roubais o tesouro, ó polícias, ó guardiães da ordem estabelecida. Venci-vos em combate na confeitaria. Todo eu sou vertigem, abismo. Danço sobre o abismo com todos os meus demónios. Vede como ele está possesso, como ele está fora de si, ó seguidores. Abandonai-o. Deixai-o a pregar sozinho na praça. Ele canta o caos e o apocalipse mas também o amor, a vida vindoura. Ele é da vida. Por isso nos berra e insulta. "Custa-me deixar-te mas tu nunca me seguirias". Ouve a voz doce da única amiga. Está na Trofa, no colégio, dá-lhe a mão, namora com ela. Tudo é inocência e descoberta. Depois o rapaz desceu ao mundo, conheceu a maldade e a violência. Interrogou o mundo, quis saber as respostas, de bar em bar andou em busca. Não sabia claramente quem era nem o que queria. Foi à escola, trabalhou, mas algo lhe dizia que não tinha vindo para isso. Encontrou Morrison, Dionisos, Zaratustra, seguiu-lhes os passos, mas havia ainda algo que o prendia à terra dos relógios. Por oito anos vagueou por entre as caras. Ouvia ainda a voz da máquina e os merceeiros. Hoje deixou de ouvi-los. Eles ainda estão na praça mas o homem superou-os. Sabe que a riqueza está nas profundezas de si mesmo e no amor que o liga à mulher bela, ao belo, à beleza. Agora procura companheiros, companheiras.

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