Wednesday, September 10, 2008

ANTIPOETA

O que é um antipoeta:

Um comerciante de urnas e de ataúdes?

Um sacerdote que não crê em nada?

Um general que duvida de si mesmo?

Um vagabundo que se ri de tudo

Até da velhice e da morte?

Um interlocutor de mau carácter?

Um bailarino à borda do abismo?

Um narciso que ama todo o mundo?

Um trocista sangrento

Deliberadamente miserável?

Um poeta que dorme numa sela?

Um alquimista dos tempos modernos?

Um revolucionário de pacotilha?

Um pequeno burguês?

Um charlatão?

Um deus?

Um inocente?

Um aldeão de Santiago do Chile?

Sublinhe a frase que considere correcta.


O que é a antipoesia:

Um temporal numa chávena de chá?

Uma mancha de neve numa rocha?

Um açafate cheio de excrementos humanos

Como crê o padre Salvatierra?

Um espelho que diz a verdade?

Uma bofetada no rosto

Do Presidente da Sociedade de Escritores?

(Deus o tenha no seu santo reino)

Uma advertência aos poetas jovens?

Um ataúde a jacto?

Um ataúde a força centrífuga?

Um ataúde a gás de parafina?

Uma capela ardente sem defunto?


Marque com uma cruz

A definição que considere correcta.






Nicanor Parra, com tradução de Henrique Manuel Bento Fialho, do blogue Insónia, e a quem agradecemos o envio deste poema.


in La camisa de fuerza, 1962-1968

publicado na revista "DiVersos – Poesia e Tradução", N.º 12, coords. Jorge Vilhena Mesquita e José Carlos Marques, Dezembro de 2007






(imagem de Julia Lucich)

Publicada por Ricardo Pulido Valente em 10:35
http://a-unica-real-tradicao-viva.blogspot.com

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