Saturday, May 05, 2007

A ILIADA NO VELVET


Á Liliana


Não sou menos do que em Agosto

mas as meninas já não vêm


volto ao bar escuro

quase sem cheta

como nos anos 90

em Braga

o estrelato quase à porta

e a cidade não me dá nada

não se passa absolutamente nada


Não sou menos do que Augusto

mas à minha volta só vejo

gajos, putos e mulheres tomadas

a cidade está deserta


às vezes parece renascer

com o balançar das tuas ancas


Perdi o último metro

a estrela está só

a menina bonita já não está

e eu estou a perder a lata

nem sequer tenho cacau

para apanhar uma borracheira

sou de Braga do porto

era lá que deveria estar

e não aqui neste bar murcho

apesar da moira ser muito simpática


ao que parece,

nada se vai passar até às 6,

nem tão pouco conversas com putas,

travestis e amigos das multas

que nos oferecem poemas

e são tesoureiros da Junta de Freguesia


só putos e tédio

não há rock nada rola

e a menina bonita não está

não vai estar mais


deveria ter ido para casa-

dizem a moral e o bom senso

só aparecem putos e mais putos

e eu escrevo

porque dizem que sou um poeta maldito

com tendências alucinatórias e visionárias

e os meus admiradores e detractores

esperam isso de mim

entregue a mim próprio

com poemas, livros e palavras

que não consigo transmitir às gajas

de que gosto e espeto no papel


olho para o cu da gaja que está ao balcão

e o mundo renasce

o mundo das tatuagens

dos vidros partidos

dos automóveis

da bófia

do bailarino

do sangue na guelra

do homem em guerra

e já me apetece cantar outra vez

usar e abusar de vez

onde está a menina?


Bebo e, uma vez mais,

agradeço a amabilidade

e a doçura da Li Han


Aguardo a fiesta

sempre é preferível à conversa

dos gajos sem conversa


onde está a magia de Agosto,

de Paredes de Coura,

onde as miúdas te olhavam,

te procuravam e se metiam contigo?

Pensaste que eram tudo provocações,

"Era o Rouxinol e era a Rita",

tiveste medo e agarraste-te à menina

do Gerês que amas,

que realmente amas

e queres acariciar, cobrir de beijos,

abraçar para sempre,

a menina que ficou na tenda

enquanto tripavas no hotel

a menina que te deu de comer,

de beber e te vestiu

quando a chuva te batia nos cornos

a menina que te despertou do transe

és a estrela mas permaneces teso


e as ancas continuam a balançar ao balcão

não sabes se hoje ou qualquer noite

te dirigirão a palavra

que se foda!

ao menos aqui sabes que escreves livremente

enquanto que no outro tasco

te abandonaram quando usavas da palavra

sobraram 7 ou 8

7 ou 8 amigos, 7 ou 8 espectadores

para a estrela do rock n' roll

7 ou 8...em Paredes eram 500...


o bar enche e já há algumas gajas

que não conheces nem elas te reconhecem

o resto são putos

e música foleira


aos 38 anos, o poeta subversivo e surrealista

que vai à rádio e aos jornais

no meio de putos que não sabem quem és

nem querem saber

38 anos e sobram as ancas da gaja

dos blue jeans ao balcão

38 anos e hoje de nada te vale a canção

nem tens palco para brilhar

e o teu amigo canta em Famalicão

onde deverias estar

afinal, ias lá ficar noite fora

noite fora e ninguém à tua mesa

noitr fora e os putos não gramam a tua cena

a única que te topa é a Li Han

sempre não é agarrada ao pau

como o outro camarada

e apetece-te beber a noite toda

mesmo que a noite não dê em nada

apetece-te continuar com a Ilíada no Velvet

que começou com duas loiras

no café das ruas da cidade antiga


és Dionisos, Aquiles, Ulisses

e ninguém te reconhece

já não há deuses nem semi-deuses

Esparta está minada

mesmo que fiques até de madrugada

a escrever baboseiras que ate podem

ter algo de sublime

mas não te servem de nada


tens a quem sair

sabes que não tens emenda

e podes cair de novo

touro no meio da arena

da música foleira

escreves e ninguém dança

escreves para encher a pança

ou a alma ou o caralho que seja


és a puta do rock

à cata de clientes à cata de estrelas

és a puta do rock

e cantas daqui a uma semana

és a puta do rock

e vais ficar até de madrugada

és a puta do rock

e és de Braga

és a puta do rock

e não se passa nada

és a puta do rock

e andas com as voltas trocadas

és a puta do rock

e não sacas mulher nem te esforças por nada

és a puta do rock

e o mundo é uma merda

tal como s música foleira que passa.


Aqui ninguém te ama

e escreves rock n' roll para a sanita

contas os trocos e não sobra nada

onde está a fama? A cama?

A Glória? a MULHER que te grama?


É o rock e a amiga...

é o rocker no meio do nada

a boazona do teu amigo

nem sequer te chama

é o rock sem a amiga...

é o rock e a derrocada...

é o poeta e o anarca aos papéis

até de madrugada

é o sexo à mão de semear

com o fio dental à molhada.


Até sei que isto numa "soirée" de poesia

num tasco qualquer dá direito a palmas

mas aqui...é morte d' alma

é a morte do artista

são versos para a sepultura


escrever...morder...morrer...

escrever...e acabar sem nada...


ondem páram os teus amigos,

velhos companheiros de noitada?

Onde páram aqueles

que te beijam a cara?


Poema épico até de madrugada

Lídia Cavalo de Tróia

Afrodite vinda das àguas

reis de que vens

Alexandre, o Grande,

sangue de poeta

mulher que foges

a meio da batalha

mulher que entras e sais

e te sentas ao som da batida

Allen Gingsberg beat generation

beber até ao raiar da aurora.


A. Pedro Ribeiro, VELVET, Vila do Conde.





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